Inflação e juros em alta, Supply Chain global em lenta recuperação, reabertura da China, guerra estendida na Ucrânia, novo governo no Brasil… O ano de 2023 não está com cara que vai ser menos emocionante do que 2022!
E para nós, planejadores, que temos que prever o futuro e tomar decisões com base nessas previsões, a emoção começa antes mesmo dos problemas acontecerem. Sofrer por antecedência faz parte do nosso trabalho. Mas estar preparado para os problemas também faz.
Para te ajudar a estar preparado para 2023, separamos aqui as seis principais tendências que vão afetar o S&OP neste ano.
1. Aumentos de preço afetarão o Forecast Accuracy
Muitos setores estão se vendo obrigados a repassar aumentos de até dois dígitos percentuais para seus clientes. E talvez isso não ocorra de uma vez só, mas em várias parcelas ao longo do ano.
Isto é causado principalmente pelo aumento da inflação global, que afeta o preço dos insumos. Este aumento veio forte em 2022, e tudo indica que continuará acontecendo em 2023, segundo as projeções dos principais institutos do Brasil e do Mundo.
Como todo planejador de demanda sabe muito bem, o efeito do aumento de preço no volume previsto para um determinado SKU é bastante difícil de prever. Além da modelagem matemática desta relação preço-demanda ser desafiadora, frequentemente nos deparamos com a falta de dados.
Como a maioria das indústrias não muda o preço com tanta frequência, acabamos ficando sem muitos eventos para analisar.
Como se preparar para esta tendência
Junte os dados disponíveis dos últimos três a cinco anos de eventos de mudança de preço.
Para “engordar” o número de eventos para o modelo, busque agrupar produtos com comportamento de mercado similares, como os direcionados para o público de baixa renda, por exemplo.
Depois, aplique ferramentas estatísticas para modelar as relações de causa e efeito entre o aumento de preço e a demanda, usando estes modelos para alavancar suas previsões base. Se não estiver confortável com modelos mais avançados, lembre que a boa e velha média já é um bom começo!
2. Juros altos aumentarão a pressão para reduzir estoques
Inflação alta geralmente é seguida de aumento de juros pelos bancos centrais, como uma contramedida para conter o aumento dos preços. Por sua vez, os juros altos aumentam o custo do capital. Ou seja, empresas pagam mais caro para pegar dinheiro emprestado.
Isto faz com que esforços para liberar caixa sejam mais valiosos. E um dos grandes consumidores de caixa nas empresas são os estoques. Então, não se surpreenda se receber uma visita do Financeiro da empresa propondo redução significativa do estoque em 2023.
É papel do S&OP mostrar para a companhia que o dimensionamento ideal dos estoques tem que equilibrar duas grandes contas: o Custo do Excesso e o Custo da Falta.
O Custo do Excesso é principalmente composto pelo custo de capital, que é diretamente afetado pela alta de juros.
Mas se focarmos só em reduzi-lo, podemos acabar pagando mais caro no Custo da Falta, afetado pelo baixo nível de serviço ao cliente.
Como se preparar para esta tendência
O melhor jeito de estar preparado para pressões financeiras de redução dos estoques é ter um processo de Gestão Tática de Estoques integrado ao seu S&OP.
Assim, você terá todos os argumentos para justificar a política de estoques atual na ponta da língua, e terá as ferramentas necessárias para simular os impactos de redução de estoques no nível de serviço ao cliente.
E, com isso, poderá mostrar até onde a redução de fato se paga e a partir de que nível a solução (reduzir estoques) passa a ser mais cara que o problema (falta de produtos).
3. Pressão por eficiência operacional aumentará
Se por um lado as indústrias vão sofrer pressões inflacionárias nos insumos, por outro vão sofrer pressões por preços mais baixos pelo mercado.
A economia ainda não se recuperou dos impactos da pandemia, e tudo aponta para um ano de crescimento modesto.
Um ambiente de baixo crescimento, com a renda da população apertada, não é muito receptivo a aumentos de preço.
Isto vai trazer uma pressão significativa por redução de custos e aumento da eficiência operacional.
As empresas vão precisar tirar o máximo dos ativos disponíveis, reduzindo assim os custos unitários e viabilizando um repasse de preços ao consumidor menor do que a pressão que sofrem dos fornecedores, sem sacrificar tanto o resultado.
Como se preparar para esta tendência
Se você ainda está planejando sua linha de produção e outros ativos importantes “no muque”, esta é a hora de repensar. É muito difícil otimizar a alocação da capacidade com planilhas Excel, e sua empresa certamente está deixando dinheiro na mesa.
Avalie qual seria o retorno sobre investimento de implantar uma ferramenta avançada de planejamento de capacidade dos seus principais ativos, mostrando para a empresa a redução de custo unitário que isto poderia trazer.
4. Rupturas de fornecimento de insumos começarão a reduzir
A cadeia de suprimentos global já começa a mostrar sinais de recuperação após os impactos da COVID 19.
Apesar de provavelmente ainda termos que lidar durante boa parte do ano com os altos preços das commodities ligadas à guerra da Ucrânia (como petróleo e trigo), o relaxamento da política de COVID zero na China e o retorno do custo do contêiner a patamares pré-pandemia trarão algum alívio às áreas de Compras.
Entretanto, uma máquina complexa como esta não se recupera tão rápido de um impacto tão grande.
Ainda há desbalanceamentos locais entre oferta e demanda em diversos setores, e estes ainda levarão boa parte do ano para retornar ao patamar pré-pandemia.
Como se preparar para esta tendência
Trabalhe junto ao time de Compras para avaliar a possibilidade de diversificar mais a carteira de compras com fornecedores alternativos.
Mesmo que sejam mais caros, eles podem trazer um alívio caso pressões geopolíticas voltem a sacudir o Supply Chain.
Para ajudá-los nesta tarefa, mantenha a qualidade do seu Plano Mestre de Compras de longo prazo. Esse é um insumo importante para que possam negociar contratos mais longos e previsíveis, mitigando, assim, o aumento do custo de compra.
5. Processos voltarão a olhar para o longo prazo
Parece algo que já teria acontecido em 2022, visto que já estamos saindo do olho do furacão da pandemia desde o início do ano passado. Mas conversando com diversas empresas no Brasil, vemos que o “curto-prazismo” trazido pelas turbulências dos últimos anos ainda se mostra presente em muitos processos de planejamento.
Os últimos anos viram muitas empresas reverem seu conceito de longo prazo para mês que vem, médio para semana que vem, e curto para daqui a quatro horas. Planejamento estratégico virou S&OP, S&OP virou S&OE, S&OE virou Execução, e Execução virou desespero.
Esse tipo de “trauma cultural” não se resolve do dia para a noite.
Lembre-se que um dos principais fatores que torna a implantação de um S&OP maduro um projeto de 3 a 5 anos é o fato de que só temos doze chances de errar ou acertar por ano.
Uma por mês.
Então por que voltar a ter uma mentalidade de longo prazo seria rápido?
O fantasma do curto-prazismo continuará assombrando suas reuniões em 2023.
Como se preparar para esta tendência
Use o S&OE para satisfazer a sede de curto prazo, e o S&OP para cuidar do longo.
Lembre a todos, no começo de qual reunião, qual é o escopo, prazo e objetivos de cada processo.
Caso o curto prazo ainda continue muito nervoso para sua empresa, considere a possibilidade de implantar um processo de Demand Sensing paralelo ao seu processo de Demand Planning.
6. Escassez de profissionais continuará sendo um problema
OK, eu sei que eu podia fazer essa previsão todo ano dos últimos dez anos. É como prever que o Roberto Carlos fará um show no final do ano: não tem como errar. Mesmo assim, essa aqui ainda merece o sexto lugar da lista de tendências.
Nós ajudamos a divulgar vagas de S&OP toda semana em nossa página do Linkedin e, quando conversamos com os donos das vagas, a reclamação é sempre a mesma: muitos currículos, poucos realmente qualificados.
Acaba que a maioria das contratações é uma aposta.
Trazem alguém com potencial, porém sem experiência, para aprender na prática.
Acredito que isso não vai mudar em 2023 por uma questão simples: S&OP é uma área de alta exposição, alto aprendizado e que, por isso, geralmente atrai pessoas de alto potencial.
Essas pessoas normalmente não ficam paradas muito tempo na mesma posição, o que gera uma abertura constante de vagas.
E se considerarmos que mesmo empresas de milhares de funcionários tendem a ter times de S&OP que não ultrapassam dez pessoas, não é difícil chegar à conclusão que nunca vai ser fácil achar um profissional experiente de S&OP.
Como se preparar para esta tendência
Busque pessoas com potencial para o S&OP e invista em capacitação. Busque parceiros externos que possam dar um “banho de loja” inicial com consultoria e treinamento, e mentoria para o aprendizado mais prático e contínuo do dia a dia.
Como eu disse no início, ninguém em sã consciência está prometendo que 2023 será um ano fácil.
Mas olhe pelo lado positivo: quanto mais problemas o futuro aponta, mais o S&OP tem trabalho para mostrar!
